A sensação de tempo

O relógio é apenas um objeto que foi construído pelo homem na tentativa de “controlar” o tempo. Mas o homem foi surpreendido pela escravidão do seu próprio tempo. Tempo este que o domina, o manipula, o escraviza, o determina, o faz ter emoções de raiva e estresse, porque para tudo existe uma hora e essa hora tem que ser cumprida. Os valores da vida, como a liberdade advinda do livre arbítrio, o direito de se sentir feliz, de poder escolher o seu tempo de folga, de férias, de alegria, de ócio criativo se foram.

Dizem que as condições de vida têm melhorado, bem como o convívio na sociedade. Dizem que o relógio trouxe o beneficio de estipularem a jornada de trabalho, para que explorações não fossem feitas. Será que isso é verdade?

E qual é o momento em que não nos estressamos no trânsito e com alguém que amamos apenas por causa do tempo? Porque se um dia inventaram o relógio, disseram que nossas tarefas teriam um tempo, que seria contado? A impressão que a sociedade de risco criou para si mesma é que o tempo está passando muito rápido e a frase “já estamos em março” vem como uma bomba que causa uma explosão, que em milésimos de segundos atinge nossa consciência, que por vezes está anestesiada e camuflada pela velocidade que criamos para o tempo.

 Tempo este que continua o mesmo, pois o relógio continua a contar esse mesmo tempo que é o mesmo desde antes de Cristo. Mas a doença atual da ansiedade nos trouxe a impressão de que NÃO; o tempo está voando. Ou será que o homem está com pressa? Mas pressa do quê? E essa pressa tem motivos? E esse motivo seria: vai levar muito tempo fazer massagem na minha mulher até começarmos a transar, e depois tenho que dormir, porque amanhã tenho que trabalhar e apresentar um projeto numa reunião (trecho do Filme Click).

O relógio conta o agora e o homem faz o favor de contar o amanhã. Pois, essa necessidade do amanhã e, nunca do hoje, o faz pensar que essa é a maneira correta. Esse é o caminho da felicidade! Ora bolas… Se for assim: cadê a minha felicidade? O meu prazer em poder sentir o vento soprar em meu rosto? Em me encantar com um sorriso de uma linda mulher; poder inspirar a alegria de ver meu filho crescer; de poder estar junto e apoiar quem necessita; em poder sentir a liberdade em meu caminho; em poder andar devagar e olhar ao meu redor e ver as árvores e os animais que ainda circulam pela cidade grande; em observar que aquele esgoto já foi um rio; em ver que naquela rua meus avós brincavam de amarelinha.

E... hoje, o que ouço são as buzinas dos automóveis com pressa em correr contra o tempo. Como se aquele tempo contato pelo relógio fosse ser vencido pela minha rapidez em correr, em falar, em comer, em explicar e poder terminar aquele dia como mais um dia vencido… ou perdido. E, quando se vê, estamos velhos, doentes, cansados porque corremos tanto e usamos tantos cremes para retardar aparentemente nossa velhice, que aquele tempo que finalmente temos para passar com a família, não é possível. Pois, agora essa família está no momento do ritmo frenético que o faz correr contra o tempo. E, você que é visto como velho; vê que todo o tempo que você já correu, você conseguiu chegar a algum lugar. O lugar em que você pode observar que as pessoas estão escravizadas pelo relógio e pela ansiedade de viver uma vida doentia que produz jeitos e coisas que o faz pensar que esse tempo você é quem domina ou está deixando ser dominado.

Não espere pelo tempo, pelo tal dia em que você terá tempo. Abrace, cante, sorria, brinque, pule, alegre-se, veja, observe, encante-se. Viva a vida sem correr, sem estresse. Ame-se mais, ame os outros. Descubra a alegria de ser feliz na magia de poder ter tempo para as melhores coisas da vida, coisas que vão além das atividades sociais obrigatórias. Viaje pelo tempo com a calma de um urso que hiberna.

Nunca é tarde nem demasiado para falar sobre a nossa conduta de vida com relação ao uso do tempo. Pense nisso!

Anexo:
   Acho que a foto abaixo faz lembrar da complexidade da organização do nosso tempo, que foi o que tentei desabafar. Veja o quanto é ótimo e criativo o desenho dos doze coelhos iguais segurando um relógio (lembrei da Alice no país das maravilhas) na parede da estação do metro Cais do Sodré (Lisboa). Na parte de baixo está escrito: Estou atrasado. 



Até uma próxima...